Déficit em conta corrente termina o ano no menor nível desde 2007
O déficit em conta corrente fechou 2016 em US$ 23,5 bilhões ou 1,3% do PIB
Itaú BBA
Julia Gottlieb
24.01.2017
O déficit em conta corrente fechou 2016 em US$ 23,5 bilhões ou 1,3% do PIB (contra US$ 59 bi ou 3,3% do PIB em 2015). A principal contribuição para a redução do déficit veio da balança comercial, que foi superavitária em US$ 45 bilhões. Os déficits de serviços e rendas também contribuíram, com recuos de US$ 6,5 bi e US$ 1,3 bi, respectivamente.
Do lado do financiamento, o ano foi marcado por investimento direto no país resiliente, mas fortes saídas dos fluxos de investimentos em renda fixa local.
Para os próximos anos, mantemos a nossa projeção de déficits baixos, ainda que crescentes, sem comprometer a sustentabilidade externa.
O déficit em conta corrente no mês de dezembro somou US$ 5,9 bilhões, acima das nossas expectativas (US$ 4,8 bi) e do consenso do mercado (US$ 4,5 bi). Acumulado em 12 meses, o déficit em conta corrente avançou pela primeira vez desde 2014 (para US$ 23,5 bi ou 1,3% do PIB). A média móvel trimestral dessazonalizada e anualizada também avançou para US$ 29 bi em dezembro. Ao longo de 2016, o déficit em conta corrente recuou 60% em relação a 2015 (US$ 23,5 bi ante US$ 58,9 bi), registrando o menor valor desde 2007.
A balança comercial apresentou superávit de US$ 4,2 bilhões, abaixo dos US$ 6,1 bi registrados em dezembro de 2015 quando foi registrada a exportação de uma plataforma de petróleo, inflando o resultado daquele mês. Com um superávit de US$ 45 bi em 2016 (ante superávit de US$ 18 bi em 2015), a balança de bens foi a principal contribuição positiva para a redução do déficit em conta corrente ao longo do ano.
O déficit de serviços somou US$ 3,4 bilhões em dezembro, uma piora em relação aos US$ 2,5 bi registrados em dezembro de 2015. O déficit de viagens internacionais seguiu avançando (para US$ 941 mi ante US$ 653 mi em dezembro de 2015), mas foi parcialmente compensado pelo recuo na contas de aluguel de equipamentos (déficit de US$ 2,0 bi ante US$ 2,1 bi). O déficit de transportes manteve-se praticamente inalterado (US$ 317 mi).
No ano, no entanto, o déficit de serviços recuou pelo segundo ano consecutivo: de US$ 37 bi em 2015 para US$ 30 bi. O déficit de viagens internacionais e transportes foram os principais destaques recuando 26% (de US$ 11,5 bi para US$ 8,5 bi) e 34% (de US$ 5,7 bi para US$ 3,7 bi), respectivamente.
A conta de rendas teve déficit de US$ 7,0 bi, um aumento em relação aos US$ 6,5 bi observados no mesmo mês do ano passado. O pagamento de juros, principal surpresa em relação à nossa projeção, somou US$ 3,1 bi (ante US$ 2,5 bi em 2015).
O déficit de lucros e dividendos (sazonalmente mais elevado em dezembro), por sua vez, recuou e somou US$ 3,9 bi este mês, ante US$ 4,0 bi em dezembro de 2015.
No ano, o déficit de rendas recuou de US$ 42,4 bi para US$ 41,1 bi, explicado basicamente por menores remessas de lucros e dividendos para o exterior.
Na conta financeira, o investimento direto no país (IDP) surpreendeu mais uma vez e somou US$ 15,4 bi, acima das nossas estimativas (US$ 9,0 bi) e do consenso de mercado (US$ 7,2 bi). Do IDP total, apenas 57% veio na forma de participação no capital, percentual menor do que o observado nos últimos meses. Destaca-se no mês o aumento do IDP na modalidade de empréstimos intercompanhia, com operaçoes no setor de coque, derivados de petróleo e biocombustíveis totalizando US$ 7,4 bi.
Em 2016, o IDP somou US$ 78,9 bi (4,4% do PIB) e foi a principal fonte de financiamento do déficit em conta corrente. O IDP cobriu a totalidade do déficit em conta corrente em 2016.
O investimento estrangeiro no mercado local de capitais foi negativo pelo quinto mês consecutivo (saídas de US$ 766 mi). Foram registradas saídas de US$ 2,0 bi do mercado local de renda fixa, parcialmente compensadas por entradas de US$ 1,3 bi no mercado local de ações. Ao longo de 2016 foram registradas saídas de US$ 15,8 bi, o maior valor da série histórica (desde 1995), em função das elevadas incertezas no cenário doméstico e internacional no ano.
As reservas internacionais terminaram dezembro em US$ 372,2 bi pelo conceito liquidez e US$ 365,0 bi pelo conceito caixa. A diferença de US$ 7,2 bi se deve ao posicionamento do Banco Central em linhas com recompra.
Em suma, o déficit em conta corrente recuou pelo segundo ano consecutivo. O câmbio (em média) mais depreciado e a atividade em ritmo fraco contribuíram para esse ajuste que foi disseminado entre todos os principais itens. Na conta financeira, o IDP se elevou e seguiu cobrindo a totalidade do déficit em conta corrente, diminuindo a dependência de capitais mais voláteis (como investimento em portfólio).
Para os próximos anos, esperamos que a combinação de câmbio médio ligeiramente mais apreciado (em termos reais) e recuperação da demanda doméstica resultem em déficits em conta corrente maiores, mas sem prejudicar a sustentabilidade das contas externas.
Confira no anexo a íntegra do estudo realizado por JÚLIA GOTTLIEB, cenarista e analista do Itaú BBA